Política
Por que a rejeição ao governo cresce, mas o apoio fica intacto
A rejeição ao mandato de Jair Bolsonaro alcançou o maior patamar. Segundo pesquisa do instituto Datafolha, 43% dos brasileiros consideram o governo ruim ou péssimo. O maior índice anterior havia sido registrado no fim de abril, com 38% de reprovação ao presidente.
Divulgada na quinta-feira (28), a pesquisa ouviu 2.069 entrevistados por telefone entre segunda (25) e terça (26), com margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
O levantamento foi realizado um mês após a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça e dias depois da liberação do vídeo de uma reunião ministerial que integra o inquérito sobre suspeitas de interferência presidencial na Polícia Federal.
As entrevistas também ocorreram num momento em que o país bate recordes de mortes pela covid-19, doença causada pelo novo coronavírus e minimizada recorrentemente por Bolsonaro.
Enquanto a rejeição aumentou, o grupo que aprova Bolsonaro se mantém consolidado em 33%, com pouca oscilação para cima ou para baixo ao longo de vários levantamentos. Já aqueles que acham o governo regular caiu para 22%.
TRAJETÓRIA
Se comparado a presidentes anteriores, o desempenho de Bolsonaro no segundo ano do mandato só não é pior numericamente do que o de Fernando Henrique Cardoso que, em maio de 1996, registrava 30% de aprovação. No caso do tucano, o bloco de rejeição era menor (25%) e os que achavam a gestão regular dominava os brasileiros (41%).
2º ANO DE MANDATO
Na avaliação feita por nível de escolaridade, a reprovação a Bolsonaro foi significativa entre quem possui nível superior: 56% acham a gestão ruim ou péssima ante 47% na pesquisa de abril. A alta também ocorreu entre quem possui apenas ensino fundamental: de 36% em abril para 43% em maio.
Duas análises sobre a avaliação de Bolsonaro
Diante do aumento da rejeição e da estabilidade entre os apoiadores, o Nexo ouviu dois cientistas políticos para entender o que explica o atual desempenho do presidente. São eles:
Maria Hermínia Tavares, professora emérita de ciência política da USP
Carlos Pereira, cientista político e professor de administração pública da FGV-SP
Por que a rejeição aumentou?
MARIA HERMÍNIA TAVARES Dois fatores aparecem na pesquisa: o comportamento do governo federal no combate à pandemia e a divulgação do vídeo da reunião ministerial ocorrida no dia 22 de abril. Ainda que a pergunta sobre a pandemia não apareça nessa pesquisa, em um levantamento da XP de algumas semanas atrás, já era possível ver a queda da [popularidade de] Bolsonaro e a ascensão dos governadores.
Com certeza a divulgação do vídeo impacta essa pesquisa, em três pontos. A pandemia já matou quase 30 mil brasileiros e, mesmo nessa situação, o assunto não foi tratado naquela reunião. O segundo ponto tem a ver com o comportamento muito pouco adequado, seja do presidente, seja dos seus ministros, com a quantidade de palavrões, como se fosse uma conversa de bar, com pessoas de pouca polidez e educação. Esses dados mostram que a população está perdendo a confiança no governo. O terceiro ponto é que a disputa com o ex-ministro Sergio Moro e a suposta interferência na PF dizia respeito a assuntos pessoais do Bolsonaro. O vídeo mostra o presidente, durante uma situação crise, se preocupando apenas com seus amigos e sua família.
CARLOS PEREIRA Primeiro de tudo é a forma como ele gerenciou a pandemia. Ao manter o estilo de polarização que vinha imprimindo em outras políticas, acabou se afastando da maioria da população brasileira, incluindo um grupo considerável dos seus próprios eleitores. Ao contrário do que se imagina, há um contingente importante de eleitores de centro-direita e de direita que apoiam as medidas de isolamento social e tem uma opinião negativa em relação ao Bolsonaro. A pandemia foi um choque de proporção tectônica, que quebrou o padrão tradicional de polarização. Bolsonaro perdeu com isso.
O segundo motivo é a saída do ministro Sergio Moro do governo. Esse foi outro choque, mas de natureza endógena. Era uma referência moral para o governo, que agregou muito apoio em função da luta contra a corrupção. A saída e as denúncias que Moro fez, de que Bolsonaro queria acobertar investigações, fez com que o presidente perdesse apoio.
Talvez seja cedo, mas Bolsonaro deu um cavalo de pau rumo aos acordos com políticos do centrão. Ele passou parte do governo fazendo uma associação entre presidencialismo de coalizão e corrupção, dizendo que não entraria nesse jogo. Mas quando viu a possibilidade real do impeachment, buscou uma coalizão com partidos não ideológicos como forma de sobrevivência.
Por que a aprovação se mantém na casa dos 30%?
MARIA HERMÍNIA TAVARES Olhando as pesquisas, já há uma mudança na composição daqueles que apoiam. Quando Bolsonaro foi eleito, ele tinha uma aprovação muito alta no segmento de alta renda, educação superior, homens, do sul do Brasil e com tendência evangélica. Hoje há uma redução de apoio nesse grupo de homens ricos e educados. Pode ter havido uma mudança nesse grupo que apoia. Apesar do número ser o mesmo, não significa que sejam as mesmas pessoas. Ele começou a perder apoio, ainda que tenha bastante, em determinados grupos, geralmente aqueles que têm mais acesso à informação.
CARLOS PEREIRA Isso acontecia na esquerda, também. Por mais que se apontasse evidências contra o ex-presidente Lula, existia um núcleo duro de apoiadores do PT que permaneceu com ele. A mesma coisa se dá com Bolsonaro. Essa conexão acontece a partir de uma identidade, que é muito difícil de ser quebrada. Alguém que apoia, que votou no Bolsonaro, não vai reconhecer malfeitos nesse governo. O mecanismo de proteção do grupo são as construções dessas identidades, formado por pessoas que não se atualizam. Esse grupo só consome informação que reforça a sua crença anterior, e rejeita informações que possam se contrapor ao que ele pensa.
Esse desempenho põe Bolsonaro em que situação diante da crise e de ameaças de impeachment?
MARIA HERMÍNIA TAVARES Esses 30% significam uma porcentagem alta. Os dois presidentes anteriores que sofreram impeachment, o [Fernando] Collor e a Dilma [Rousseff], tinham aprovação perto dos 10%. A literatura sobre crises presidenciais e respectivas destituições salientam algumas condições: crise econômica que possa ser atribuída a uma ação presidencial, a perda do escudo parlamentar e ausência de base sólida no Congresso, e a opinião pública com mobilizações contra o governo. Neste momento, não há como fazer manifestação, com exceção das pessoas irresponsáveis. Isso significa que algumas condições protegem Bolsonaro. Nenhum presidente da Câmara dos Deputados começa um impeachment com chance de derrota, e com 30% de apoio ao governo é difícil começar qualquer ação nesse sentido.
Agora, nós estamos diante de um governo que sequer tem claro como vai manter o apoio à população e às empresas, por exemplo. Uma das coisas que a reunião mostra é que [Paulo] Guedes [ministro da Economia] não tem nenhum plano, e o governo não tem sensibilidade nenhuma. Nós não temos um governo para o que é necessário nesse momento, mas ao mesmo tempo não existem condições para substituí-lo.
CARLOS PEREIRA Bolsonaro tem implementado desde antes do início do governo uma relação direta com o núcleo duro de sua base. Ele abre mão do eleitor mediano e alimenta esse núcleo duro com uma agenda polarizada. Ele acredita que, ao manter esse grupo organicamente, ele terá condição de se proteger do impeachment e manter chances de reeleição.
Isso é uma estratégia de governos minoritários, que é o caso de Bolsonaro, mesmo com essa coalizão com centrão. Essa coalizão não gera governabilidade, mas sobrevivência. Diante desse cenário, ele vai fazer de tudo para manter esse grupo como escudo protetor. A não ser que ele consiga formar uma coalizão ampla, estável e saiba gerenciar esse grupo, mas isso é muito difícil de acontecer nesse momento. (Nexo)
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